quarta-feira, 14 de novembro de 2007

Transcrição: Escrevendo a Liberdade


Alexandre da Silva Camilo
Preso no Centro de Detenção Provisória de Suzano – SP






















Vem devagar...
Nem sabe se pode entrar.
No peito se espalha...
Com desejo e sentimentos.
É fatal! Nunca falha.
Conquista...
Esse jeitinho altruísta.
Contente...
Serve milimetricamente.
Convence...
Quebra barreiras e vence.
Consigo traz a calma;
E penetra em minha alma.
Só aqui te conheci.
Então pude te sentir.
És mais que ir e vir.
Vem e leva todo o mal.
Se torna mais especial.
No coração carente;
Encaixa eternamente.
Diante desta emoção,
Se transforma em doação.
No fundo do peito;
Vejo que a sempre tive.
Mas nunca me senti;
Verdadeiramente livre.
Sinto falta sim;
Com muita sinceridade.
Inunda, habita em mim;
Maravilhosa liberdade.

Transcrição: Liberdade 2007


Anderson Aparecido Machado
Preso no Centro de Detenção Provisória de Diadema - SP

Toquinho de madeira, alpiste e água. Toquinho de madeira, alpiste e água. Toquinho de madeira, alpiste e água. Toquinho de madeira, alpiste e água. Toquinho de madeira, alpiste e água. Toquinho de madeira, alpiste e água. Toquinho de madeira, alpiste e água. Toquinho de madeira, alpiste e água. Toquinho de madeira, alpiste e água. Toquinho de madeira, alpiste e água. Toquinho de madeira, alpiste e água. Toquinho de madeira, alpiste e água. Toquinho de madeira, alpiste e água. Toquinho de madeira, alpiste e água. Toquinho de madeira, alpiste e água. Toquinho de madeira, alpiste e água. Toquinho de madeira, alpiste e água. Toquinho de madeira, alpiste e água. Toquinho de madeira, alpiste e água. Toquinho de madeira, alpiste e água. Toquinho de madeira, alpiste e água. Toquinho de madeira, alpiste e água. Toquinho de madeira, alpiste e água. Toquinho de madeira, alpiste e água. Toquinho de madeira, alpiste e água. Toquinho de madeira, alpiste e água. Toquinho de madeira, alpiste e água. Toquinho de madeira, alpiste e água. Toquinho de madeira, alpiste e água. Toquinho de madeira, alpiste e água. Toquinho de madeira, alpiste e água. Toquinho de madeira, alpiste e água. Toquinho de madeira, alpiste e água. Toquinho de madeira, alpiste e água. Toquinho de madeira, alpiste e água. Toquinho de madeira, alpiste e água. Toquinho de madeira, alpiste e água. Toquinho de madeira, alpiste e água. Toquinho de madeira, alpiste e água.

O menino abriu à gaiola; Ele voou por três dias... Morreu de fome.

segunda-feira, 27 de agosto de 2007

Livro: Cobras e Lagartos


Autores: josmar josino (Reportagem)
2005 260 Páginas
ISBN 8573026588
R$ 44,90 Reais (Preço sugerido)

A vida íntima e perversa nas prisões brasileirasQuem manda e quem obedece no partido do crime

"A historia do crime não se contará sem referência a este livro" – Luiz Eduardo Soares

Este livro revela a crueldade, o cotidiano, a vida promíscua e desesperada das principais prisões brasileiras. Cobras e Lagartos apresenta também os momentos mais importantes da formação do Primeiro Comando da Capital, mais conhecido como Partido do Crime ou, simplesmente, PCC.
Jornalista há mais de 20 anos e repórter policial experiente, em 2003, Josmar Jozino sofreu uma suposta ameaça de morte por presos ligados ao crime organizado e passou meses acompanhado de escolta particular. Nessa época, o repórter decidiu contar tudo o que sabia a respeito do PCC: sua fundação, seu funcionamento e seus atos criminosos, além de casos polêmicos envolvendo os presos, a polícia, o sistema prisional e várias autoridades.

Assim, escreveu Cobras e Lagartos, livro baseado em suas investigações, informações de suas fontes e depoimentos das mulheres dos presos, muitas delas grandes amigas do repórter, depois de anos de convivência.
Caveirinha, apelido do repórter, ficou conhecido em São Paulo por ter o telefone das primeiras-damas dos chefes mais poderosos do Partido do Crime, conseguir informações de bastidores e ser sempre um dos primeiros, senão o primeiro, a saber, dos últimos acontecimentos envolvendo o PCC.

A partir da história de Sombra, famoso ladrão de jóias e de bancos, Caveirinha reconstrói toda a história da facção, que se tornou uma força cada vez maior dentro e fora dos presídios paulistas. Bem organizado, com centrais telefônicas clandestinas à disposição, esquemas de recolhimento de dinheiro para o financiamento de compra de armas e drogas, corrupção de funcionários dos presídios e contando com um verdadeiro exército de "lagartos" para executar ordens nas ruas, o PCC transformou-se em um grande desafio para as autoridades paulistas.

Passando pelas vidas de seus grandes chefões, pelas rebeliões nas prisões, atentados e outros crimes atribuídos ao PCC, o autor tece com clareza a trajetória do crime organizado em São Paulo nos últimos anos. O repórter esmiúça uma história repleta de emoção, mas também de atos de crueldade, com a autoridade de quem a conhece muito bem e de perto.

Josmar Jozino é jornalista desde 1984 e depois de passar por vários jornais e rádios de São Paulo, trabalha hoje para o Jornal da Tarde como repórter de polícia. Ganhou o apelido de Caveirinha dos colegas de redação do Diário de S. Paulo, já que era muito magro e fumava muito. Profundo conhecedor da dura realidade dos presídios brasileiros, já foi contemplado com a menção honrosa do prêmio Wladimir Herzog de Direitos Humanos por uma série de reportagens.

Depoimentos sobre "Cobras e Lagartos"

Eis aí um livro irresistível e impressionante, que assombra, comove, perturba nossas certezas e guarda relíquias preciosas: as pequenas histórias de vida que se entrelaçam, formando o destino que o crime torna comum. As cenas de crueldade não devem nos iludir: esta não é uma obra sobre a violência, mas sobre o equívoco de supor que as portas do presídio dividem o mundo entre o bem e o mal. Quem criou o PCC, diz um dos fundadores, foram alguns presos e a direção da penitenciária, porque a brutalidade do Estado é cúmplice do ódio. Aprendemos, com os relatos diretos, secos e intensos, que a reincidência não é um resultado, é um pressuposto, um destino atribuído e reforçado institucionalmente. A história do crime não se contará sem referência a este livro. E há muito tempo, infelizmente, a história do Brasil já não se conta sem alusão ao crime.

- Luiz Eduardo Soares, antropólogo, cientista político, ex-coordenador de segurança, justiça e cidadania, do estado do RJ, e ex-secretário nacional de segurança pública.

"Cobras e lagartos" revela diferentes faces de um desatino. Detalhes da grande rebelião nos presídios de São Paulo, do nascimento de uma facção criminosa, da conivência e corrupção de autoridades, da prostituição infantil nas celas do Carandiru. O livro conta os bastidores de um sistema que parece funcionar como um moto-contínuo, uma rosca sem fim que, como um furacão, devasta instituições, vidas e sonhos. Um furacão que ameaça tragar todos nós.

- Fernando Molica, jornalista e vencedor do prêmio Wladimir Herzog 2004 - categoria reportagem TV.

Aqui vemos a tragédia das nossas prisões; aqui vemos a aflição e a agonia dos parentes de presos. Aqui vemos amores entre grades; ódio sem igual; medo da morte, mesmo a morte sendo eterna companheira de cela. Aqui vemos nascer e florescer o crime organizado dentro das cadeias.

Josmar Jozino nos conduz pelos corredores sombrios e imundos de nossos presídios. Com poesia, com sensibilidade, com pesquisa, com coragem, o competente repórter disseca uma história da qual sempre se falou muito, mas pouco se soube a respeito: a fundação de uma das mais atuantes organizações criminosas do País. O PCC.

Neste livro-reportagem – rico em detalhes e episódios marcantes -, aprendemos que os lagartos são os soldados da facção. Aqueles que obedecem as lideranças, os cobras. E o mais intrigante: aprendemos que os presos formam um exército com grande poder e influência na vida de quem se diz livre, nós? Ao fim da leitura, percebemos nitidamente que não é o sistema prisional que está falido. É nossa própria sociedade. Sem baixo astral, é livro de impacto. Obra de qualidade.

- César Tralli, jornalista, repórter investigativo e apresentador da TV Globo.

Amor Bandido

Elas desafiam o bom senso e procuram namorados nas cadeias. Eles abandonam as parceiras na prisão.

ROMANCE











Cristiane, de 25 anos, não gosta de homem honesto

Elas não temem a fúria dos homicidas nem a frieza dos seqüestradores. Tampouco se importam com a astúcia dos assaltantes ou a violência dos traficantes. Há mulheres que desafiam o senso comum e vão à procura de namorados nas penitenciárias. Para conseguir uma vaga no coração de um ladrão, elas encaram até o constrangimento das revistas, em que cada milímetro do corpo é inspecionado. As moças são enfeitiçadas por carta e telefone ou convencidas a experimentar um affair atrás das grades por um parente ou amigo detento. Classificados e programas de rádio estão sempre na mira dos detentos. Na fase da conquista, as moças vivem tórridos romances. Depois os afagos se transformam em controle e, muitas vezes, em agressão. Apesar de todos os embaraços, algumas fazem do amor bandido um projeto de vida.
A recíproca não é verdadeira. Ao fim da luta pela igualdade entre homens e mulheres atrás das grades, as detentas de São Paulo conquistaram o direito à visita íntima no ano passado. A comemoração durou pouco. Logo se descobriu que a maioria havia sido esquecida pelos maridos. Apenas 5% das presidiárias recebem visitas do companheiro, contra 75% no sistema prisional masculino.
Ao contrário dos homens, as mulheres costumam ter posição secundária no mundo do crime. Quando são presas, perdem o lugar e os rendimentos. Sem vantagens para oferecer, elas são logo substituídas no coração volúvel dos namorados. Os homens, não, eles mantêm a vida amorosa e os negócios funcionando no mesmo ritmo de quando estavam nas ruas. Em solidariedade aos solteiros, os presidiários arregimentam primas e amigas. Alguns detentos têm três ou quatro namoradas ao mesmo tempo. O famoso traficante Luiz Rodrigues, o Chacrinha, tinha oito na extinta Casa de Detenção. Só não arrumou mais porque foi morto durante uma rebelião.
Dois meses depois de terminar o casamento com um ex-presidiário, Cristiane da Silva Lima, de 25 anos, resolveu investir num novo romance. Escolheu um homicida da Penitenciária do Estado, na Zona Norte de São Paulo. Trocou dúzias de cartas e juras de amor com o matador. No mês passado foi conhecê-lo. Passou a madrugada preparando maionese, macarrão, torta, bolo e pudim. Um "jumbo" de respeito para o pretendente. Às 7 horas da matina saiu de Cidade Tiradentes, na Zona Leste da capital paulista.
Chacoalhou dentro de um ônibus durante uma hora. Tudo em vão. Como numa história de folhetim, a falta do RG a deixou do lado de fora, aos prantos. Dias depois, soube por uma amiga que o homicida já tinha mulher. "Lá eu não volto mais", garante. Aprendeu? Nada.
Menos de 24 horas após o rompimento, o coração da moça foi fisgado num Chat da internet por um "moreno forte". O dom-Juan cibernético não se intimidou com o risco de ser pego em falta disciplinar e punido com uma temporada na solitária. Tratou de seduzir a moça e agora espera pelas visitas.
Do lado de dentro dos muros, eles mantêm mão-de-ferro. Pobre da mulher que não andar na linha. "O meu namorado me controla. Os amigos dele contam tudo o que faço na rua", diz Vanessa Corrêa, de 18 anos, apaixonada por um seqüestrador. "Gosto das coisas difíceis e do jeito nervosão e estúpido dele", conta. O cupido foi um detento amigo da moça. O primeiro contato aconteceu por telefone. "Conversamos durante um mês e resolvi arriscar", diz.
É comum a polícia, nas escutas telefônicas, interceptarem romances em vez de informações estratégicas. "Vou te levar num lugar cheio de homens legais e lindos", dizia uma operadora de uma central telefônica clandestina, a uma amiga solteira. O convite para visitar uma penitenciária foi registrado num grampo. Há três anos, um mega casamento no Carandiru oficializou a união de 111 casais. Quatro em cada dez pares haviam iniciado o relacionamento atrás das grades.
"Só tenho namorado de cadeia", declara Michele Teixeira, de 19 anos. O primeiro era estelionatário, o segundo ladrão de banco, o atual puxava carros. Todo domingo ela gasta quase duas horas no trajeto entre Diadema e a Penitenciária do Estado. Ainda não levou o filho para o parceiro conhecer. "Ele assumiu o menino e me ajuda com algum dinheiro", conta. Na parede da cela, Eduardo pendurou fotos de Michele e do bebê. Guarda os pertences dela na prateleira: creme hidratante, xampu e escova de dente. A estudante explica a atração fatal com ar maroto. "Gosto de aventuras", diz.
Na classe média, namorar homens bem formados e endinheirados confere status. Nas comunidades tomadas pela criminalidade o amor bandido pode ser sinônimo de ascensão social. "As pessoas não conseguem me olhar, tem medo", conta Michele. Há dois meses, ela escapou de uma suspensão porque a diretora da escola foi avisada de que a garota namora um criminoso.

PAIXÃO












A ., de 18 anos, esconde da família o romance com um detento

SEM MARIDO












A assaltante Rita despista a solidão fazendo o crochê que decora a cela

Os Dom-Juans preparam-se com afinco para o dia mais importante da semana, o da visita. Os aficionados de exercícios físicos improvisam halteres com cabos de vassoura e garrafas de refrigerante. Passam horas correndo e esculpem os bíceps e o tórax com flexões. Cuidam da alimentação como podem. Ovos crus, considerados afrodisíacos, são desviados da cozinha. Amendoim e achocolatados completam a dieta dos que desejam melhorar a performance sexual. Usam todos os artifícios possíveis para manter a mulher. Longe das grades, os romances tornam-se rarefeitos. Em geral, acabam depois que os galãs vão para as ruas.
Na véspera do grande dia, os presos cortam o cabelo e fazem o mutirão da limpeza. Lavam cada canto, expulsam todo o pó. Ajeitam as camas e trocam os lençóis. Tapam com toalhas os pôsteres de mulheres peladas nas paredes. Nenhuma roupa íntima pode ficar à mostra. Andar sem camisa, então, nem pensar. As visitas são sagradas e sempre tratadas com respeito. As leis da detenção são seguidas à risca. Quem desafia os preceitos não recebe perdão. A pena mínima é um corretivo, a máxima é a morte.
Os detentos andam de olhos baixos, com as roupas sempre limpas e bem passadas e os sapatos lustrosos. Não encaram as moças e quando lhe dirigem a palavra as chama de senhora. Só fazem a corte com a permissão do anfitrião, como nos tempos antigos.Num domingo de 1997, no Carandiru, um viciado em crack cedeu a mulher a um traficante para quitar dívida de drogas. No dia seguinte os dois foram "justiçados" por causa da pouca-vergonha.
As benesses da vida bandida - mesada graúda e roupas de grife - são para poucas. O ex-chefão do PCC José Márcio Felício, o Geleião, conheceu a esposa, Petronilha Maria Carvalho Felício, quando ela fazia um trabalho voluntário na cadeia. Policiais e promotores contam que Geleião, um valentão condenado há 62 anos por homicídio, roubo e estupro, revela-se um sentimental quando fala em Petrô. O casal protagonizou o maior golpe no PCC ao delatar nomes, estrutura e ações da facção no ano passado. Está jurado de morte.

VIGILÂNCIA












Mesmo atrás das grades, o namorado de Vanessa controla todos os seus passos.

SOBREVIVÊNCIA












Enquanto faz simpatias para o marido voltar, a traficante Cida corteja as moças

O perfil do anti-herói também causa frisson em meninas bem-nascidas. "A mulher moderna quer ter o controle do relacionamento", avalia Jesus Ross Martins, ex-diretor da Casa de Detenção. "Quando ela se envolve com um preso, o relacionamento é estável e a decisão de visitá-lo ou não é só dela", diz. O fascínio pelo desconhecido e o espírito transgressor são ingredientes que podem temperar a inclinação. Uma história recente foi o casamento da cantora Simony com o rapper Cristian de Souza Augusto, o Afro-X. Ele ganhou liberdade condicional em julho do ano passado, depois de sete anos de cadeia.
Nos anos 80, a jornalista Marisa Raja Gabaglia envolveu-se com o cirurgião plástico Hosmany Ramos, condenado há 21 anos. A filha de um político carioca namorou o traficante Roberto de Moura Lima, o Meio Quilo.
Não existem romances do gênero nas prisões de mulheres. As celas femininas são territórios de solidão. Ter mulher atrás das grades não confere prestígio nem proteção ao homem. Quando o marido possui ficha limpa, geralmente não aceita uma criminosa.
"Tinha certeza de que ele ia me deixar. É muita humilhação", desabafa Claudinéia de Oliveira, de 26 anos, dois filhos. O relacionamento de 14 anos não resistiu à prisão. Condenada a mais de uma década por assalto à mão armada, ela passa os dias escrevendo. Acumulou 38 correspondentes simultâneos. Já tentou "abanar", o ritual no qual as moças, do pátio ou das janelas, trocam sinais com os enclausurados da Penitenciária do Estado, a 100 metros dali. As mais afoitas gritam. As solitárias acenam lenços. Agora Claudinéia arranjou um pretendente preso em Pirajuí, no interior de São Paulo. Trocam 20 cartas por semana. Vale tudo: poemas recortes de revistas e piadas. "Só o conheço por foto. Mas já fazemos planos", diz.
O lesbianismo, inclusive o circunstancial, é comum nas cadeias. "As chances de uma mulher conseguir um namorado depois de presa são mínimas", diz Maria da Penha Dias, diretora da Penitenciária Feminina da Capital. Detida pela sexta vez, a última por tráfico, Maria Aparecida da Silva, de 30 anos, tenta driblar a solidão paquerando as companheiras. Em um ano, já namorou duas. Cida não se conforma por ter sido desprezada pelo marido, mecânico, com quem teve seis filhos. Mandou cartas, pensou em suicídio. Vive às voltas com simpatias. Todas as tardes, ela se agarra às grades da janela e entoa um mantra: "Ta louco, Cearense, volta pra mim. Eu te amo".


Enquanto 75% dos presos namoram apenas 5% das detentas têm visita íntima.

terça-feira, 10 de julho de 2007

CRP de Bernardes apresenta problemas nas celas

SISTEMA PENITENCIÁRIO – SP

Defensoria Pública de São Paulo divulga relatório em que afirma que reformas realizadas no presídio de Presidente Bernardes, no interior de São Paulo, geram preocupações à sanidade mental e física dos detentos.

No início de novembro, cerca de 40 internos do Centro de Readaptação Penitenciária (CRP) de Presidente Bernardes, no interior de São Paulo, realizaram uma greve de fome, encerrada depois de treze dias, reivindicando mudanças no modelo de encarceramento adotado no presídio. Inaugurado em 2002 como uma unidade de segurança máxima, o CRP conta atualmente com poucos detentos. Todos são submetidos ao Regime Disciplinar Diferenciado (RDD), segundo ao qual o interno mantido em cela individual, só tem direito a duas horas de banho de sol por dia.

O presídio dispõe de bloqueadores de celular e placas de aço no piso para evitar escavações de túneis. Cabos de aço circundam o prédio e o pátio de sol é coberto com tela de arame de aço a fim de evitar tentativas de resgate via aérea. São utilizadas algemas nos presos nas movimentações internas. A única ocupação oferecida são dois livros de leitura e um didático que podem ser requisitados semanalmente.

Na semana passada, a Defensoria Pública de São Paulo divulgou um relatório de inspeção realizada no local que denuncia condições inadequadas do Centro. No dia 21 de novembro, em função de denúncia recebida pelos familiares dos presos, o defensor público Carlos Weis, também membro do Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária – que tem entre suas atribuições promover a avaliação periódica do sistema criminal – visitou o presídio acompanhado pelo diretor do estabelecimento, Luciano César Orlando. Uma das críticas era em relação à instalação de chapas de aço nas janelas das celas. Segundo os presos, isso teria prejudicado a ventilação do ambiente e a entrada de luminosidade. Em documento entregue ao presidente do Tribunal de Justiça de São Paulo, esposas dos internos relataram que “as celas possuem portas de aço, sem qualquer abertura, por mínima que seja para ventilação. As janelas possuem tela, chapa de aço e vidro, que impedem a entrada de ar na cela e, quase que totalmente saber se é dia ou noite, baseando-se, apenas, na luz que se acende e se apaga, sendo que tal situação está ocasionando vários pedidos de enfermaria, por problemas respiratórios, inclusive com inalações, a princípio atendidos, mas atualmente restringidos, o que está afetando a integridade física e psicológica dos detentos, já que não possuem nenhuma condição de sobrevivência, com dignidade”.

Em mensagem enviada à coordenadoria, Simone Barbaresco, esposa de um detento disse que os internos estavam sem ar. “Por favor, como pode um ser humano sobreviver nestas circunstâncias. Peço-lhes que nos ouçam e nos ajudem no que for possível. Em momento algum estamos pedindo regalias ou coisa parecida. Venho pedir que vejam a situação desumana”, escreveu.

De acordo com o relatório da Defensoria Pública, a instalação das chapas de aço não prejudicou a entrada de luminosidade nas celas. No entanto, a substituição dos vidros transparentes pelos vidros jateados trouxe graves conseqüências ao impedir a visão dos presos. A impossibilidade de ver com nitidez o exterior, na avaliação de Carlos Weis, aumenta consideravelmente a sensação de isolamento – as celas possuem as dimensões mínimas admitidas pela lei – e impede que o preso olhe a uma distância superior a três metros, isso se estiver na extremidade da cela, o que pode acarretar transtornos psiquiátricos, comportamentos claustrofóbicos ou distúrbios relativos à visão.

"A impossibilidade de olhar a uma distância superior a três metros e o entorno inteiramente branco gera sérias preocupações quanto à sanidade mental e ótica dos presos que, por lei, são obrigados a permanecer em tal ambiente por 22 horas diárias, por até 360 dias", afirma Weis.
Para ele, como ao detento do CRP só resta à leitura e levando em conta que 88% da população carcerária paulista é analfabeta ou possui ensino fundamental incompleto, o entorno inteiramente branco é preocupante. Em relação à ventilação, o defensor afirmou a importância da realização de um estudo técnico para verificar se a aeração e temperatura são adequadas à existência humana. Tal estudo se faz especialmente necessário em função à elevada média de temperatura da região oeste de São Paulo. Na região de Presidente Bernardes, é comum a temperatura atingir os 40ºC.

COMUNICAÇÃO

Outro ponto da denúncia apresentada pelas famílias se referia às mudanças no parlatório usado nas visitas. Segundo as esposas dos detentos, foram instalados vidros grossos, que isolam reeducandos e visitantes. “O diálogo tem que acontecer por frestas mínimas na base destes vidros (...) É praticamente impossível o diálogo não gritado e as crianças, sobretudo pequenas, não conseguem alcançar a bancada (...) impedem de olharem e conversarem com seus pais”, diz a denúncia. Na avaliação da advogada Iracema Vasciaveo, responsável pelo documento entregue ao presidente do Tribunal de Justiça de São Paulo, tanto a Secretaria de Administração Penitenciária como a diretoria da unidade não têm o direito de estender a pena aos familiares do preso, causando traumas irreparáveis. “A Lei que regulamenta as condições do RDD em momento algum delibera que visitas em unidades de RDD têm de ocorrer em tais condições”, afirma. Para a inspeção da Defensoria, a comunicação nos novos parlatórios não é falha, apesar da instalação de vidros e grades que impedem o contato físico entre o preso e as visitas. O defensor destacou que o impedimento do contato físico é uma medida extrema, mas não ultrapassa os limites legais neste aspecto.

DIREITO À GREVE DE FOME

A greve de fome promovida pelos detentos de Presidente Bernardes no início de novembro foi tida por eles como a única alternativa para chamar a atenção das autoridades do estado para as condições em que se encontram. Na denúncia apresentada pelas esposas, o relacionamento entre os reeducandos, funcionários e a diretoria do CRP havia se tornado “inviável, sem qualquer possibilidade de diálogo, pois tudo tornou-se motivo para punições e instauração de sindicâncias, onde apenas a palavra do funcionário tem credibilidade e peso”. A direção do presídio alega que a greve de fome decorreu de uma posição de firmeza assumida pela Secretaria de Administração Penitenciária em face da depredação de celas e de ameaças e condutas dos presos em relação os funcionários, principalmente depois de maio e junho, quando o Primeiro Comando da Capital (PCC) realizou uma série de ataques no estado de São Paulo. Eles teriam passado a buscar aquilo que a direção entende por “regalias”: recebimento de mercadorias de seus familiares, a instalação de rádio e televisão na unidade prisional e a realização de visitas com contato físico. Como isso foi negado, eles teriam danificado as celas ocupadas. O ápice da tensão teria ocorrido nas noites de 29 e 30 de junho, quando várias celas foram danificadas, levando à reforma do presídio.

Contra os detentos que realizaram a greve de fome, foi instaurada uma sindicância por violação da disciplina penitenciária, o que é condenável para a Defensoria Pública de São Paulo.

"A simples realização de greve de fome é ato que não compromete a segurança da unidade ou mesmo do sistema penitenciário, antes se revestindo de mecanismo político de expressão do pensamento e das convicções, largamente utilizado na história da humanidade", afirmou Weis.

“É princípio basilar do direito penal que a condenação criminal não retira do ser humano outros direitos que aqueles relacionados diretamente à pena, notadamente a liberdade de locomoção. Assim, a liberdade de expressão do pensamento, desde que exercida por meios que não ameacem ou ofendam a integridade física ou moral de outrem, é legitima e constitucionalmente protegida. No caso de presos, justamente por se encontrarem em situação de isolamento e dependência dos funcionários responsáveis por sua contenção, o uso de tal expediente pode ser o único meio eficiente de exercitar referida liberdade e tornar público seu ponto de vista, o que não pode caracterizar falta disciplinar, eis que se trata do exercício legítimo de um direito constitucionalmente protegido, na vigência do Estado Democrático de Direito”, completou.

A INCONSTITUCIONALIDADE DO RDD

Ainda em seu relatório, o defensor Carlos Weis lembra que desde 2004 o Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária mantém um parecer em que afirma que o Regime Disciplinar Diferenciado é inconstitucional ao definir o isolamento celular por 22 horas diárias. O regime é contrário não apenas ao dever constitucional de o Estado respeitar a integridade física e moral dos presos, mas também às Regras Mínimas para o Tratamento de Presos estabelecidas pela Organização das Nações Unidas (ONU) e às normas de interpretação da Convenção contra a Tortura e outros Tratamentos ou Penas Cruéis, Desumanos ou Degradantes da ONU. Segundo o parecer, o RDD também não propicia oportunidade de reintegração social do condenado, um dos objetivos do cumprimento de pena conforme estabelecido pelas leis em vigor.

"A realização da inspeção, assim como as conclusões e recomendações, não significam revisão desta posição e nem admitem que a unidade penal esteja de acordo com as orientações do Conselho. No entanto, algumas medidas podem ser tomadas para minorar a situação de violação da dignidade humana, sem prejuízo da segurança", afirmou Weis.

Uma delas seria realizar um esforço de ressocialização os internos, a partir de atividades que abrissem novas perspectivas de vida e de orientação moral e ética aos presos. "Tratando-se de pessoas que, supostamente, transgrediram com maior gravidade as regras legais de conduta e que, igualmente, podem pertencer a grupos criminosos organizados, com maioria de razão é de se supor que o Estado encete medidas capazes de propiciar-lhes novas opções, ao invés de buscar apenas a dissuasão de suas condutas pela imposição de castigos severos", concluiu. O secretário da Administração Penitenciária, Antônio Ferreira Pinto, declarou na semana passada que deve reduzir o número de presos que cumprem pena no RDD.

segunda-feira, 9 de julho de 2007

Oração do preso

Quando olhares para os que nos aprisionaram e para aqueles que à tortura nos entregaram;
Quando pesares as ações dos nossos carcereiros e as pesadas condenações dos nossos juízes;
Quando julgares a vida dos que nos humilharam e a consciência dos que nos rejeitaram.

Esquece, Senhor, o mal que por ventura cometeram. Lembra, antes que foi por este sacrifício que nos aproximamos do teu filho crucificado:

Pelas torturas adquirimos suas chagas;
Pelas grades, a liberdade de espírito;
Pelas penas, a esperança de teu reino;
Pelas humilhações, a alegria de seus filhos.

Lembra Senhor, que desse sofrimento brotou em nos, qual semente esmagada que germina o fruto da justiça e da paz, a flor da luz e do amor.

Mas, lembra, sobretudo, Senhor, que jamais queremos ser como eles, nem fazer ao próximo o que fizeram a nós.

Amém!


Leonardo Boff

Rico vai para a prisão?

“No Brasil se diz que rico não vai para a prisão”.

Quando vai, é uma exceção que vira notícia nacional. O Censo mais recente nada publicou a respeito. Mas, no Censo anterior, o dado apresentado era de que 95% dos presos eram pobres. Situavam-se entre os ricos os assaltantes de banco, os grandes e médios traficantes, alguns médicos, advogados e outros profissionais liberais, presos por assassinatos ou crimes sexuais.
Embora apenados com prisão em nosso Código Penal, vários crimes típicos das classes ricas, como a corrupção, a fraude, a sonegação fiscal, o contrabando, não resultam em pena de prisão. Nem a polícia está preparada e voltada à repressão destes crimes, nem os juízes e promotores públicos são rigorosos com estes crimes. Até a linguagem popular faz diferença no tratamento. O criminoso de origem pobre é chamado genericamente de bandido. O criminoso de origem rica é denominado por outras palavras específicas: corrupto, fraudador, sonegador, contrabandista.
Quando se trata de assassinato, o criminoso de origem rica não é chamado de assassino: dá-se-lhe o nome de mandante. Quando se trata de roubo, o criminoso rico é chamado de receptador. Com o desenvolvimento do crime organizado, muitos criminosos que se situam na cúpula das quadrilhas ficam normalmente impunes, devido às deficiências da polícia em chegar até eles, ou ainda devido à proteção que lhes dão alguns setores da polícia e do Judiciário, e ao apoio que encontram entre parlamentares e governantes.
No Censo anterior, verifica-se que, de todos os presos do País, apenas três lá estavam por serem corruptos. O que não é compatível com a convicção popular de que há um alto e generalizado grau de corrupção nas instituições públicas. Havia apenas seis pessoas presas por sonegação fiscal, o que também não é adequado ao dado que cerca de 40% da economia do País se move no mercado informal. Também a Justiça e a polícia dão pouca importância às mortes causadas pelo trânsito: havia, no Censo anterior, apenas 25 pessoas presas no Brasil por este motivo. "